sexta-feira, 10 de outubro de 2008

É isso?

A dor ainda aguça meus sentidos mais do que qualquer outra coisa. Meu raciocínio acelera, célere, lépido, quase cruel, e então minha fichas caem com o peso de chumbo. Converso com músicas, mas como elas só conversam entre elas, quietas e silenciosas, eu me sento e escuto.

É isso? Nosso amor se tornou uma pira funerária, com labaredas famintas e grossos rolos de fumaça que se esticam e se desenrolam, mas olhando a cena você constata: pôxa, como é bonito. Eu digo "bacon", você diz "salada"; eu digo "marginal", você diz "consagrado". Eu engulo, você experimenta.

É isso? Pra ser sincero, um dia desses, num desses encontros casuais, talvez eu diga

... minha amiga!
Prazer em vê-la!
Até mais!,

e essa possibilidade me cai como um soco frio no estômago.

... prazer em vê-la!,

e meu corpo se incendeia, fico pensando se meu rosto ficou vermelho.

até mais... ,

e desmorono por dentro, de alto a baixo, até não sobrar nada. Se sobra, pelo menos não faz mais barulho, não emite mais som, não respira nem reclama. Clinicamente, o diagnóstico é "temporariamente morto por dentro".

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

De oito em oito anos

De oito em oito anos nos encontramos; de oito em oito anos nos explicamos. E, de oito em oito anos, nos perdemos.

Ela:

Havia muito tempo que não nos víamos. Você disse que eram oito anos, e tá bom, eu acredito; mas isso não explica nada, não explica como você pode me conhecer tão bem, não explica como pode me explicar assim, assim. As palavras, o jeito, as colocações - é como se me espionasse, me vigiasse invisível e intangível. Bruxo, bruxo.

Mas ah, sei dos seus truques. E mesmo que não saiba, finjo que sei, já que na nossa situação isso não faz diferença. Não te conheço, é quase um estranho, um cigano maltrapilho com brinco na orelha e ar de mistério.


Ele:

Não presto atenção, não noto, mas me apaixono numa questão de minutos - e com você não foi diferente, foi? Espera, respondo: não foi. Eu só queria descansar, mas você veio e puxou papo, ficou falando de um monte de coisas, falando sem parar, e quando eu vi, pronto: tava reparando no seu cabelo, nos gestos das mãos, no fino dos lábios, no fundo luminiscente dos olhos. Reparei até no tênis, e nas meias, que eram muito bonitas. Só não reparei quando te quis, e nesse ponto já era tarde: te analisei, interpretei, disse coisas inteligentes, bonitas também, disse o diabo, e deixei o sol se por no seu rosto, vermelho e dourado. Você gostou, e antes de se despedir disse "bom, até daqui a oito anos".

Oito anos? Não, eu menti, eram só três. Mas na nossa situação, isso não faz diferença.

domingo, 10 de agosto de 2008

A (ins)ciência dos vícios

Já quebrei meus grilhões, dirás talvez. Também o cão, com grande esforço, arranca-se da cadeia e foge. Mas, preso à coleira, vai arrastando um bom pedaço da corrente.

-Pérsio - Sat. V - 158

Procuro me livrar dos vícios de qualquer jeito, nem que seja inventando outros vícios. É porque prefiro inovar nos erros, pelo menos eu não erro duas vezes da mesma forma. Funciona? Óbvio, não funciona. Venho com esse papo pra cima de qualquer um, é claro, mas só eu sei que não passa de um embuste, de uma farsa. Meus vícios não têm mistério - são invencíveis e pronto (ponto).

Somar é fácil, enquanto que subtrair - ah!, subtrair é quase um orgasmo, e disso eu entendo. E se sou vulgar, é porque posso sê-lo: sempre o fui, sempre com cuidado, e todo o pudor do mundo jamais me pôde desmascarar. Mas isso também não é merda nenhuma, já que o pudor é uma coisa totalmente acéfala; mas vulgaridade, pra
isso sim é preciso de inteligência, muito embora haja também versões burras e vulgares de vulgaridade. E acrescento que dessas versões meus vícios não se sustentam, e confesso que parte do meu prazer reside na vã qualidade dessas coisas.

terça-feira, 15 de julho de 2008

Curvas em círculos

Ela tinha problemas sérios. Mas eu também tinha meus próprios problemas, então nisso éramos parecidos.

Abundância é a palavra de ordem: tudo sobra, tudo ferve, excede; e excessivo é também o buraco que tudo deixa. Não é uma condição, é um estado pleno - a vida de agora está fadada a uma metamorfose irrefreável e descarada. Qualquer que seja o futuro, me importo dramaticamente com o que será feito de agora, que já foi e que portanto é passado. O que faço? O que fiz? Quero de volta, quero sentir outra vez.

Círculos viciosos não estão mais na moda. Inventaram alguma coisa nova, sem forma nem contornos, que no fim das contas leva às mesmas... mesmices.

Mesmices: mimetizo meu comportamento e assim sou notado. Ou é o contrário? Seja qual for o sentido, a hipocrisia prevalece, charmosa. Mas, quando se é o próprio (e único) fiscal, não há risco algum. Haveria? Não conheço ninguém que tenha contraído uma doença de si mesmo. Em nós mesmos podemos confiar, pois todas as decepções se quitam na morte.

Fui remendado às pressas. Só não queria esses curativos coçando, incômodos.

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Primeiro post e a garota do ukelelê

Bom, nada é para sempre; e como meu errante blog da errante weblogger tornou-se por demais errático, decidi (após três incessantes anos) que este era o momento certo de abandoná-lo à própria sorte. E mesmo que não seja o momento certo, azar - se fosse pra depender da weblogger, eu estaria publicando meus textos em portas de banheiro masculino, ou pior, em folhas de papel higiênico (daqueles rosas). E nem me venham com piadinhas sanitárias...

E só pra preencher o vazio fútil que preenche todo primeiro post, aqui vai:



A menina é genial, e tem uma voz muito bacana. Isso sem contar o fato de que consegue, sozinha, se passar por uma banda inteira.

E tenho dito ^_^