quarta-feira, 15 de junho de 2011

Sobre como jamais, jamais lavar louça


É do senso comum que, dentro da grande nação que é a cozinha, o ato de lavar a louça é bem mais do que um mero dever: é uma obrigação cívica, uma demonstração moral de cidadania e higiene. Das pequeninas e simpáticas colheres de café até as desafiadoras e aterrorizantes panelas encardidas com óleo de fritura, são muitos os artifícios que a pia – esse monstro tirânico que nada teme e nada poupa – possui para nos testar até os limites da nossa paciência e da pele de nossas mãos. Não existem leis depois de abrir a torneira: ou você lava tudo, ou morre tentando.

Porém, essa era de agonia doméstica finalmente chegou ao fim. Há entre nós um herói, alguém que ouviu os milhões de lamentos ensaboados ao redor do mundo e os sintetizou numa solução adstringente definitiva para nossas batalhas contra aquele arroz queimado que grudou no fundo da panela.

Sim, meus caros, há uma solução... ou quase.

Apresento-lhes o fantástico, o rebelde, o irrecusável GUIA SOBRE COMO JAMAIS, JAMAIS LAVAR LOUÇA NUMA REPÚBLICA, escrito e editado por ninguém menos do que Leandro Freitas, o jovem mineiro que alcançou fama mundial pela façanha de nunca, jamais haver lavado um copo sequer.

Em entrevista exclusiva ao Sabe... ?, Leandro nos conta que nem tudo eram flores em sua vida. Logo aos dezessete anos ele se viu obrigado a sair da casa dos pais e morar num alojamento estudantil em Rio Preto, cidade do interior paulista, para cursar a universidade. Mas foi na cozinha desse alojamento que nosso intrépido rapaz começou a desenvolver as primeiras técnicas que lhe trariam fama e fortuna. “Eu já tinha idéias sobre como não ter que lavar louça desde os meus treze anos”, esclarece, “mas foi só quando comecei a fazer faculdade que realmente pude botar tudo em prática”.

Pois bem, chega de lenga lenga. Sabe... ? trás até vocês, em primeira mão, alguns excertos desse verdadeiro balde de sabedoria que é o GUIA SOBRE COMO JAMAIS, JAMAIS LAVAR LOUÇA NUMA REPÚBLICA, que será lançado no próximo mês pela editora Katcho Books:



GUIA SOBRE COMO JAMAIS, JAMAIS LAVAR LOUÇA NUMA REPÚBLICA

(ou: 277 passos elementares para fazer que os outros lavem a louça por você)


Passo #1: não sujou, não lavou – não cabe a você lavar uma louça que não é sua.

Passo #2: se você disser que vai lavar louça, não precisa dizer quando você vai lavar a louça.

Passo #9: ao encher uma panela com água para amolecer a sujeira, você fica automaticamente dispensado da obrigação de lavar essa panela.

Passo #13: louça suja sobre o fogão é algo fora da sua jurisdição. Ignore-a.

Passo #14: louça suja sobre a mesa também é algo fora da sua jurisdição. Despreze-a.

Passo #22: após deixar louça suja sobre a pia, ausente-se de casa durante longos períodos (por exemplo, viaje). Quando voltar, pode apostar que sua louça estará limpinha e guardada.

Passo #43: se a louça é complicada demais para ser lavada (grelhas de churrasco, jarras exóticas, taças de cristal, etc.), então não lave.

Passo #44: se a louça está suja demais (panelas com óleo de batata frita, frigideiras emporcalhadas, etc.), então também não lave.

Passo #97: “no dos outros é refresco”, de fato – e é exatamente por isso que não é você quem deve lavar a jarra.

Passo #102: tirou os pratos e talheres sujos de cima da mesa? Parabéns: você está imediatamente dispensado de ter que lavá-los.

Passo #155: se foi você quem providenciou o jantar, então não é você que vai limpar a sujeira.

[Adendo ao passo #155: se foi você quem trouxe a coca-cola para o jantar, aplique as regras do passo #155.]

Passo #156: mesmo que outra pessoa tenha providenciado o jantar, não há nenhuma lei que te obrigue a lavar a louça depois (em caso de contradição com o Passo #155, consulte o Passo #97).


Gostou da prévia? Então garanta já o seu!

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Saia de malha

Coxas brancas, lisas e cobertas por uma saia de malha também branca, esbarram nas costas da minha mão a cada vez que tento trocar a marcha do carro.

A meia luz dos postes que passam e a penumbra fosforescente da noite se refletem na boca que se abre num sorriso, que não sei bem se é sorriso mas, seja lá o que for, estou certo de que não é meu e sim seu. Procuro entender qual é a situação e quais seriam suas implicações, se talvez a imagem de você sorrindo pra mim não seria uma ilusão criada pelos caprichos de uma mente estimulada com álcool e com suor de gente, até o momento em que uma muito grande e muito escura sombra de árvore encobre o carro (parece que resolvi estacionar numa região erma), e giro para trás a chave na ignição: o motor do carro silencia, desligado.

Silêncio. Se estivesse sóbrio, sentiria meu coração tentando explodir.

Minha mão direita solta meu cinto de segurança e posso perceber, apesar da escuridão, que você também solta o seu cinto. Te trago pra perto de mim - uma mão na nuca, a outra num dos seus seios - e quando nos beijamos meus lábios me transmitem a mensagem de que sim, você estava sorrindo o tempo todo, inclusive agora mesmo, orgulhosa da fascinação que seu corpo me causa. Desajeitadamente você tenta desafivelar meu cinto; auxilio o processo abrindo o botão e o zíper da calça; ergo minha camisa até o peito e, buscando uma das suas mãos, te guio até um ponto onde você não possa ter dúvidas quanto ao meu desejo; você me aperta, me acaricia, e me aproveito da sua excitação para tatear suas pernas, brancas no escuro, lisas por baixo da saia; toco suas curvas e suas convexidades de um modo feroz, pulsante e todavia delicado; você sai do seu assento e se vira sobre mim, pernas abertas, sentando-se de frente no meu colo; o câmbio da marcha do carro atrapalha mas não impede nosso encaixe, que é apressado, um pouco doloroso, mas molhado e perfeito; as demais partes dos nossos corpos procuram um meio de devorarem umas às outras, mão, lábios, língua, respiração; seu perfume e sua umidade se desprendem com mais força quando você aumenta a freqüência dos seus movimentos, e eu inalo tudo isso - o odor doce, a fúria, a sofreguidão.