quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Prometeu

- O que me liga a você é o desejo pela traição. - dissera sem pensar, como nas vezes em que a palavra antecede o raciocínio da censura. Era a voz da verdade, do óbvio, e portanto seu peso era condizente.

Podemos dizer que Thomas era um eterno devedor. Cada novo empréstimo de vontade a que se permitia não era senão mais uma dívida, mais um elo a ser somado aos extensos grilhões que o acorrentavam a si mesmo. Assim como Prometeu no monte Cáucaso, Thomas diarimente sentia o valor de seu afeto ser mutilado por simbólicos abutres antropofágicos (e não é simbólica toda antropofagia?). Porém, diferentemente do titã da mitologia, o valor de seu afeto não detinha a capacidade de regenerar-se com o nascer de um novo dia; ele fenecia lenta e dolorosamente, como uma pessoa que, enferma, é informada da data de sua própria morte.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Tato...

Estico o braço pela janela do carro, para fora, sentindo o frio do vento e abrindo a mão (num aceno desajeitado) para a chuva que passa. Me pego torcendo por algo, e por isso mesmo passo a torcer ainda mais: torço para que uma, pelo menos uma gota d'água atinja dolorasamente minha pele e eu então acorde para as coisas pelas quais realmente se vale a pena acordar.